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31 de maio de 2011

O Código Florestal e a quinta coluna

Há alguns dias publiquei um texto sobre a aprovação do Código Florestal que, a meu ver, foi uma decisão acertada para o País - com a vantagem de mostrar um gesto de altivez do PMDB e do nosso Legislativo. Agora reproduzo artigo do deputado Aldo Rebelo (PC do B). Vale a leitura:


O Código Florestal e a quinta coluna


Conta a lenda que, ao cercar Madri durante a Guerra Civil Espanhola, o general Emilio Mola Vidal, ao ser questionado sobre qual das quatro colunas que comandava entraria primeiro na cidade sitiada, respondeu: “A quinta coluna”. Mola referia-se aos seus agentes, que, de dentro, sabotavam a resistência republicana.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a expressão tornou-se sinônimo de ações contra o esforço aliado na luta para derrotar o eixo nazi-fascista. A quinta coluna disseminava boatos, procurava enfraquecer e neutralizar a vontade da resistência e desmoralizar a reação contra o inimigo.
Após a votação do Código Florestal, no último dia 24, um restaurante de Brasília acolheu os principais “cabeças” das ONGs internacionais para um jantar que avançou madrugada adentro. A Câmara acabara de aprovar, por 410 x 63 votos, o relatório do Código Florestal e derrotara de forma avassaladora a tentativa do grupo de pressão externo de impedir a decisão sobre a matéria. O ambiente era de consternação pela derrota, mas ali nascia a tática da quinta coluna moderna para pressionar o Senado e o governo contra a agricultura e os agricultores brasileiros. Os agentes internacionais recorreriam à mídia estrangeira e espalhariam internamente a idéia de que o Código “anistia” desmatadores e permite novos desmatamentos.
A sucessão dos fatos ilumina o caminho trilhado pelos conspiradores de botequim. No último domingo, o Estado de S. Paulo abriu uma página para reportagem assinada pelas jornalistas Afra Balazina e Andrea Vialli com a seguinte manchete: “Novo Código permite desmatar mata nativa em área equivalente ao Paraná”. Não há, no próprio texto da reportagem, uma informação sequer que confirme o título da matéria. É evidente que o projeto votado na Câmara não autoriza desmatamento algum. O que se discute é se dois milhões de proprietários que ocupam áreas de preservação permanente (margem de rio, encostas, morros) devem ser expulsos de suas terras ou em que proporção podem continuar cultivando como fazem há séculos no Brasil, à semelhança de seus congêneres em todo mundo.
No jornal O Globo, texto assinado por Cleide Carvalho procura associar o desmatamento no Mato Grosso ao debate sobre o Código Florestal, e as ONGs espalham por seus contatos na mídia a existência de relação entre o assassínio de camponeses na Amazônia e a votação da lei na Câmara dos Deputados. OGuardian de Londres publica artigo de um dos chefetes do Greenpeace com ameaças ao Brasil pela votação do Código Florestal. Tratam-nos como um enclave colonial carente das lições civilizatórias do império.
As ONGs internacionais consideram toda a área ocupada pela agropecuária no Brasil, passivo ambiental que deve ser convertido em floresta. Acham razoável que milhões de agricultores sejam obrigados a arrancar lavoura e capim e plantar vegetação nativa em seu lugar, em um país que mantém mais de 60% de seu território de áreas verdes.
A “anistia” atribuída ao relatório não é explicada pelos que a denunciam, nem a explicação é cobrada pela imprensa. Apenas divulgam que estão “anistiados” os que desmataram até 2008. Quem desmatou até 2008? Os que plantaram as primeiras mudas de cana no Nordeste e em São Paulo na época das capitanias hereditárias? Os primeiros cafeicultores do Pará, Rio de Janeiro e São Paulo no século 18? Os colonos convocados pelo governo de Getúlio Vargas para cultivar o Mato Grosso? Os gaúchos e nordestinos levados pelos governos militares para expandir a fronteira agrícola na Amazônia? Os assentados do Incra que receberam suas terras e só tinham acesso ao título de propriedade depois do desmatamento?
É importante destacar que, pela legislação em vigor, são todos “criminosos” ambientais submetidos ao vexame das multas e autuações do Ministério Público e dos órgãos de fiscalização. Envolvidos na teia de “ilegalidade”, estão quase 100% dos agricultores do país por não terem a Reserva Legal, que a lei não previa, ou mata ciliar, que a legislação de 1965 estabelecia de cinco a 100 metros e, na década de 1980, foi alterada para 30 até 500 metros.
Reconhecendo o absurdo da situação, o próprio governo, em decreto assinado pelo presidente Lula e pelo ministro Carlos Minc, suspendeu as multas em decorrência da exigência “legal”, cujo prazo expira em 11 de junho e que provavelmente será reeditado pela presidente Dilma.
O governo e o País estão sob intensa pressão da desinformação e da mentira. A agricultura e os agricultores brasileiros tornaram-se invisíveis no Palácio do Planalto. Não sei se, quando incorporou à delegação da viagem à China os suinocultores brasileiros em busca de mercado no gigante asiático, a presidente tinha consciência de que quase toda a produção de suínos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná está na ilegalidade por encontrar-se em área de preservação permanente.
A Câmara dos Deputados, por grande maioria, mostrou estar atenta aos interesses da preservação ambiental e da agricultura, votando uma proposta que foi aceita por um dos lados, mas rejeitada por aqueles que desconhecem ou precisam desconhecer a realidade do campo brasileiro. O Senado tem agora grande responsabilidade e o governo brasileiro precisa decidir se protege a agricultura do País ou se capitulará diante das pressões externas que em nome do meio ambiente sabotam o bem-estar do nosso povo e a economia nacional.

30 de maio de 2011

Aprovação do Código Florestal: ganhou o bom senso, o Brasil e a Democracia

Durante a eleição presidencial do ano passado, alguns eleitores de Dilma, tentando fugir do embate esquerda -direita e querendo imprimir certo pragmatismo à escolha, diziam que a eleição dela seria melhor que a do tucano José Serra porque teria maioria inédita no Congresso, o que viabilizaria reformas importantes.

A ideia em si é ruim por si só, como se o fortalecimento da democracia dependesse do consenso. Quem precisa de consenso são as ditaduras. Para o sistema democrático, penso eu, a melhor configuração é justamente a oposta: quando o Governo tem minoria. Do embate entre situação e oposição nascem ideias que, a um só tempo, agradam e desagradam a todos. Lembrava eu aos partidários da maioria dilmista que isso seria verdade e seria insignificante porque, fatalmente, algumas questões dividem a base aliada como gregos e troianos.

Por que toda esta introdução?

Achei que a divisão da base viria com a reforma tributária ou a política. Não é que veio com o Código Florestal? O Novo Código, de relatoria do deputado Aldo Rebelo (PC do B), foi aprovado de lavada pela Câmara com 410 votos a favor, 63 contra e 1 abstenção. O projeto agora deverá seguir para o Senado.

Mais que uma questão pontual, o resultado demonstra um avanço para a democracia brasileira. A participação do PMDB votando contra a vontade do Planalto - o que teria irritado Dilma Rousseff – não deixa de ser um gesto de altivez do partido, uma demonstração de que ainda tem vida própria. 

A Câmara aprovou o texto mesmo com o barulho promovido pelos extremistas do ecologismo irracional, capitaneados por Marina Silva, que queriam promover o apocalipse. Quem se deu ao trabalho de ler o texto de Aldo percebeu que o Novo Código não é nenhuma aberração – ou  ninguém teria votado pela sua aprovação com medo da Opinião Pública.

O Velho Código é de 1965. Pessoas com terras plantadas há centenas de anos foram jogadas na ilegalidade. O Brasil preserva 60% da sua mata original e 30% do bioma está como Cabral o encontrou – o que nos coloca em primeiro lugar no ranking da preservação. Se a WWF, Marina, os marineiros das redes sociais e demais ONGs querem fazer barulho por aqui – mesmo não tendo motivos para tanto – então que façam o mesmo na China, por exemplo.

Pequenos e médios agricultores, que geram milhões de empregos, participam com 30% do PIB (Produto Interno Bruto) e literalmente sustentam a balança comercial brasileira não podem ser jogados na ilegalidade. Notem que não se trata de anistiar desmatadores.  Esta é outra falácia da turma do ecologismo militante (e burro). Ocorre que donos de áreas plantadas antes mesmo do Código Velho não podem ser condenados por ele pelo princípio da não-retroatividade da lei.

Discrepâncias

O atual Código produz uma discrepância inacreditável. Vejam os números para áreas que vão de 1 a 1.000 hectares.

Taxa para Licenciamento Florestal da Propriedade Rural (LFPR), definição de área legal e APP (Área de Preservação Permanente) + projeto: R$ 10.000,00.

Taxa par Autorização de Exploração Florestal (AEF), Supressão Vegetal (ASV) +  projeto: R$ 13.225,00.

Taxa para Licenças Prévias (LP), de Instalação (LI), de Operação (LO) e projeto: R$ 33.000,00.

Taxa de Reposição Florestal Obrigatória (RFO): R$ 2.500,00.

Tudo somado e o produtor tem de pagar quase R$ 60 mil para legalizar sua terra. E veja que a legislação atual iguala terras de 1 até 1 mil hectares. Um pedaço de terra com 5 hectares é avaliado hoje em cerca de R$ 20 mil. O produtor teria de arcar com um custo quatro vezes maior para poder plantar.

Não é difícil entender que o Velho Código é prejudicial para os pequenos e médios agricultores. Essa gente produz a comida mais barata do mundo (custa aqui metade do que custa nos EUA) e foi jogada pelo Estado brasileiro, com a patrulha de ONGs xiitas e Marina Silva, no limbo da ilegalidade, impedidos de tomar empréstimos, de se desenvolver – e consequentemente contribuir para o desenvolvimento do Brasil.

A aprovação do Código Florestal de lavada na Câmara demonstra que ainda há bom senso na democracia brasileira, que não se curva às minorias de plantão organizadas para patrulhar o Congresso e defender uma causa que, também ela, joga a favor de interesses pessoais. 

Desculpe-me, Marina Silva, mas sua militância joga 90% dos produtos brasileiros, gente que produz comida barata, na ilegalidade. A senhora é promotora da fome. 

Parabéns aos deputados que votaram pelo SIM, anda mesmo difícil defender o óbvio quando muitos já se entregaram ao delírio coletivo em nome de uma suposta boa causa.............

Os gays precisam tomar cuidado: lutar pela aprovação do PL 122 é lutar contra a própria causa – e ainda corrobora para deteriorar a Democracia

Há um debate difícil na sociedade brasileira: trata-se do Projeto de Lei 122 (PL 122), que altera o texto da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, e caracteriza como crime a discriminação ou preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Na prática, a depender do caso, pode mandar para a cadeia quem manifestar preconceito contra gays, lésbicas, travestis e transexuais.

O motivo é nobre e certamente, numa análise superficial, todo mundo seria tentado a concluir que a aprovação da lei levaria à construção de uma sociedade mais tolerante, justa e efetivamente democrática. Por que, então, debater a aprovação do PL 122 é tão difícil?

Em primeiro lugar, pela intolerância da militância gay. Há muito os defensores da “causa” assumiram o comportamento de seus algozes. Um bom exemplo disto se deu na semana passada. Senadores da chamada bancada religiosa – também chamada de bancada evangélica, mesmo que alguns sejam católicos – usaram seus direitos constitucionais para barrar a votação do texto no Senado. O que se viu em seguida foi um festival de asneiras. Dentre os argumentos que os militantes pró-PL 122 apresentaram, um dos mais difundidos foi aquele que assegurava ser a votação por preceitos religiosos um ataque à laicidade do Estado.

É mentira. Estado Laico não significa Estado ateu. Há uma diferença grande entre as duas coisas. O Estado Laico se limita a não promover, em seu seio jurídico, a discriminação a favor de qualquer grupo religioso, enquanto um Estado ateu abomina e proíbe a religiosidade. Os senadores que votaram contra o PL 122 por motivos religiosos estão fazendo valer suas prerrogativas constitucionais. O ideal fundamental do Congresso Nacional é que nele estejam representados os extratos sociais mais significativos da Nação – e os religiosos são tão reais legítimos quanto os outros.

Tentar desmoralizar a decisão do Congresso ou solicitar que o STF interceda no caso (como aconteceu na equiparação dos direitos de união estável entre casais homo e heterossexuais) equivale a jogar contra a Democracia. O ataque aos religiosos promove o descrédito no Poder Legislativo – que, de mais a mais, já anda bastante desacreditado.

Apostamos no descrédito do Congresso e o acusamos de distanciamento do povo. A ideia ganha adeptos,  toma forma e força e, num tempo não muito distante, alguém proclamará inútil o Congresso porque supostamente em desalinho com os anseios da Nação. Não demora muito e teremos um Legislativo ou fechado ou refém de outros poderes. Teremos, em outras palavras, uma ditadura imposta em nome de uma boa causa.

Os que criticam a decisão da bancada religiosa, tomando para si o argumento da laicidade do Estado estão, por ignorância ou desinformação, contribuindo para a formação de uma mentalidade ainda mais nociva à Democracia, uma mentalidade que pode nos levar ao autoritarismo. Para a sobrevivência do regime democrático, é importante que os três poderes tenham independência e soberania. A decisão do Congresso pode não agradar a todos, mas é soberana e deve ser respeitada. O Estado, servo que é do seu povo, deve acatar a decisão daqueles que representam o povo - ou não são representantes só por serem religiosos?

Uma armadilha para os gays

Há outro aspecto bastante importante no PL 122 que deve ser observado. A lei pode se tornar uma armadilha para os próprios gays – sobretudo no mercado profissional. A redação do projeto de lei é confusa e, se aprovado o texto, pode se tornar uma fonte de obscuridade jurídica.

São vários os pontos em que o projeto pode voltar-se contra os gays. O art. 4º da Lei nº 7.716 diz que estaria cometendo um crime o empregador que “Praticar atos de dispensa direta ou indireta” por preconceito sexual. A pena vai de dois a cinco anos.

Já o Art. 6º passa a tratar como criminoso aquele que “Recusar, negar. impedir, preterir, prejudicar retardar ou excluir em qualquer sistema de seleção educacional, recrutamento ou promoção funcional ou profissional”. Pena? De três a cinco anos de reclusão – que é cadeia mesmo.

Agora a redação de parte do art. 5º.

§ 5º O disposto neste artigo envolve a prática de qualquer tipo de ação violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica;

Agora o principal. A parte da lei que explica quem terá autoridade para denunciar os casos de preconceito.

Art. 20-A. A prática dos atos discriminatórios a que se refere esta lei será apurada em processo administrativo e penal, que terá início mediante:
I - reclamação do ofendido ou ofendida; 
II – ato ou oficio de autoridade competente;
III - comunicado de organizações não governamentais de defesa da cidadania e direitos humanos.

Qual é, pois, o problema da lei? 

Ora, ela dá margem para que qualquer empregado gay, que possa ter sido demitido ou não-promovido por razões estritamente profissionais, alegar discriminação. E, para isto, bastaria encontrar uma ONG amiga que corroborasse a denúncia.

Qual é o efeito da medida?

O empresário, percebendo a armadilha, pode optar pela não contratação de homossexuais como maneira de proteger-se da lei. 
Ao perceber que pode ficar na mão de ONGs e outras entidades ditas “de defesa dos Direitos Humanos”, é grande a probabilidade do empregador instruir seu departamento de RH a evitar, tanto quanto possível, contratar candidatos gays.  É uma questão de lógica (releiam a lei). Como ninguém consegue definir o que seria uma “ação constrangedora de ordem filosófica” e como até uma ONG pode ter autoridade para denunciar, todos vão encontrar maneiras de não cair na armadilha da lei.

Os gays precisam tomar cuidado. Lutar pela aprovação do PL 122 é lutar contra a própria causa – e ainda corrobora para deteriorar a Democracia. ...........

A marcha da maconha reacende o “barato” da descriminalização

Nas próximas semanas, as polêmicas Marchas da Maconha deverão tomar as ruas das maiores cidades brasileiras – alguns Estados já tiveram as suas enquanto escrevo este texto. Os que delas participam defendem, no mínimo, um debate sobre o descriminalização da droga. No limite, defendem a descriminalização em si.

A tese ganhou adeptos bastante influentes. O deputado federal Paulo Teixeira (SP), líder do PT na Câmara, não só defende a descriminalização do uso como propõe a criação de cooperativas de usuários. O nome do ex-presidente americano Bill Clinton e do ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso são frequentemente citados como apoiadores da descriminalização da maconha.

Carlos Minc, ex-ministro do meio ambiente no Governo Lula e agora deputado estadual pelo Rio de Janeiro, chegou a ser filmado durante um show defendendo a legalização da droga e afirmando que os “argentinos estariam a nossa frente”.

O que une personalidades tão díspares como Paulo Teixeira, Bill Clinton, FHC e Minc? A tese de que a atual estratégia de enfrentamento do tráfico não está dando resultado e seria melhor adotar outra postura. Para embasar seus argumentos, dizem, basta que se constate a atual situação do tráfico no Brasil: aumenta a olhos vistos e a criminalização do usuário não ajuda no enfrentamento.  

É um pensamento torto, pois parte de uma premissa errada e chega, evidentemente, a uma resolução errada. Há uma série de coisas no Brasil que o poder público não consegue combater. O número de homicídios, que só cresce, configura uma verdadeira guerra civil nas cidades brasileiras. É evidência de incompetência pública. Será que devemos legalizar o ato de matar?

É uma bobagem descriminalizar o uso da maconha acreditando que a medida concorreria para desarticular o tráfico. 

Em primeiro lugar, todos concordam que, uma vez legalizado o uso, teria de haver legislação que restringisse o acesso dos adolescentes à droga – como hoje acontece com o álcool e com o cigarro. A maconha, em doses controladas, passaria a ser vendida em bares, farmácias e supermercados. Não é difícil perceber que assim como acontece hoje com o tabaco e as bebidas alcoólicas, qualquer jovem obteria maconha com certa facilidade.

Bastaria, para isso, que aquele tio maior de idade comprasse a droga e repassasse ao sobrinho ou que aquele dono de bar não cumpridor da lei vendesse ao jovem.

“Ah, mas instituir a lei é uma coisa. Se dono não cumprir, é outro papo”.

Mentira! Bobagem! Tal qual acontece hoje com as drogas lícitas, a fiscalização seria frouxa. Defender a descriminalização da droga sem desarrolar as consequências práticas é apostar numa idéia utópica que, ao fim e ao cabo, não se estabeleceria na atual sociedade brasileira.  

As consequências são essas: o tráfico não fica enfraquecido com a descriminalização. Pelo contrário: fica mais difícil combatê-lo porque a medida torna o tráfico mais difuso. O traficante deixa de ser uma figura facilmente definida na legislação para ser um tio desavisado, um dono de bar longe de fiscalização e assim por diante. Isto é falácia. O atual traficante vive na ilegalidade. Quando um parente ou dono de um estabelecimento vende maconha para um menor também está na ilegalidade. Os dois são traficantes. O que os defensores da legalização da droga querem, talvez sem perceber, é tornar mais amena a ideia do traficante – é tingi-lo com tons mais amigáveis. O tráfico em si, caracterizado pela venda da droga a quem a lei não permite, continuaria a acontecer.  

Há uma outra consequência, esta sim, grave:

Haverá o risco dos traficantes, querendo reaver o lucro perdido, agirem mais intensamente no aliciamento de adolescentes.

Assim, um aluno com 18 anos recém-completos  poderia levar a  droga para dentro da escola – sempre com a quantidade que configura “usuário”, claro. Dadas as condições das escolas brasileiras, nas quais muitos professores vêem-se acossados pelos alunos, o aluno com a droga não seria sequer molestado.


Direito sobre o corpo?

Há, ainda, os que dizem: “Mas se eu quiser usar a droga dentro da minha casa, com meu dinheiro e aguentando as consequências em meu corpo, é um problema meu, não?

Bem, mais ou menos. Se o dinheiro que você paga num baseado alimenta uma rede criminosa internacional que coloca armas na mão de crianças, então o problema é do Estado.

Os que querem reivindicar o direto sobre o próprio corpo e assim justificar o uso da maconha terão de abrir mão do direito à saúde pública. Ou bem emprega-se verba pública no combate às drogas e suprime-se o direito individual ou bem liberta-se o usuário e o impede de bater às portas do Estado quando estiver viciado

13 de maio de 2011

A marcha da maconha reacende o “barato” da descriminalização

Nas próximas semanas, as polêmicas Marchas da Maconha deverão tomar as ruas das maiores cidades brasileiras – alguns Estados já tiveram as suas enquanto escrevo este texto. Os que delas participam defendem, no mínimo, um debate sobre o descriminalização da droga. No limite, defendem a descriminalização em si.

A tese ganhou adeptos bastante influentes. O deputado federal Paulo Teixeira (SP), líder do PT na Câmara, não só defende a descriminalização do uso como propõe a criação de cooperativas de usuários. O nome do ex-presidente americano Bill Clinton e do ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso são frequentemente citados como apoiadores da descriminalização da maconha.
Carlos Minc, ex-ministro do meio ambiente no Governo Lula e agora deputado estadual pelo Rio de Janeiro, chegou a ser filmado durante um show defendendo a legalização da droga e afirmando que os “argentinos estariam a nossa frente”.

O que une personalidades tão díspares como Paulo Teixeira, Bill Clinton, FHC e Minc? A tese de que a atual estratégia de enfrentamento do tráfico não está dando resultado e seria melhor adotar outra postura. Para embasar seus argumentos, dizem, basta que se constate a atual situação do tráfico no Brasil: aumenta a olhos vistos e a criminalização do usuário não ajuda no enfrentamento.  

É um pensamento torto, pois parte de uma premissa errada e chega, evidentemente, a uma resolução errada. Há uma série de coisas no Brasil que o poder público não consegue combater. O número de homicídios, que só cresce, configura uma verdadeira guerra civil nas cidades brasileiras. É evidência de incompetência pública. Será que devemos legalizar o ato de matar?
É uma bobagem descriminalizar o uso da maconha acreditando que a medida concorreria para desarticular o tráfico. 

Em primeiro lugar, todos concordam que, uma vez legalizado o uso, teria de haver legislação que restringisse o acesso dos adolescentes à droga – como hoje acontece com o álcool e com o cigarro. A maconha, em doses controladas, passaria a ser vendida em bares, farmácias e supermercados. Não é difícil perceber que assim como acontece hoje com o tabaco e as bebidas alcoólicas, qualquer jovem obteria maconha com certa facilidade.

Bastaria, para isso, que aquele tio maior de idade comprasse a droga e repassasse ao sobrinho ou que aquele dono de bar não cumpridor da lei vendesse ao jovem.

“Ah, mas instituir a lei é uma coisa. Se dono não cumprir, é outro papo”.
Mentira! Bobagem! Tal qual acontece hoje com as drogas lícitas, a fiscalização seria frouxa. Defender a descriminalização da droga sem desarrolar as consequências práticas é apostar numa idéia utópica que, ao fim e ao cabo, não se estabeleceria na atual sociedade brasileira. 

As consequências são essas: o tráfico não fica enfraquecido com a descriminalição. Pelo contrário: fica mais difícil combatê-lo porque a medida torna o tráfico mais difuso. O traficante deixa de ser uma figura facilmente definida na legislação para ser um tio desavisado, um dono de bar longe de fiscalização e assim por diante. Isto é falácia. O atual traficante vive na ilegalidade. Quando um parente ou dono de um estabelecimento vende maconha para um menor também está na ilegalidade. Os dois são traficantes. O que os defensores da legalização da droga querem, talvez sem perceber, é tornar mais amena a ideia do traficante – é tingi-lo com tons mais amigáveis. O tráfico em si, caracterizado pela venda da droga a quem a lei não permite, continuaria a acontecer.  

Há uma outra consequência, esta sim, grave:

Haverá o risco dos traficantes, querendo reaver o lucro perdido, agirem mais intensamente no aliciamento de adolescentes.

Assim, um aluno com 18 anos recém-completos  poderia levar a  droga para dentro da escola – sempre com a quantidade que configura “usuário”, claro. Dadas as condições das escolas brasileiras, nas quais muitos professores vêem-se acossados pelos alunos, o aluno com a droga não seria sequer molestado.

Direito sobre o corpo?

Há, ainda, os que dizem: “Mas se eu quiser usar a droga dentro da minha casa, com meu dinheiro e aguentando as consequências em meu corpo, é um problema meu, não?

Bem, mais ou menos. Se o dinheiro que você paga num baseado alimenta uma rede criminosa internacional que coloca armas na mão de crianças, então o problema é do Estado.

Os que querem reivindicar o direto sobre o próprio corpo e assim justificar o uso da maconha terão de abrir mão do direito à saúde pública. Ou bem emprega-se verba pública no combate às drogas e suprime-se o direito individual ou bem liberta-se o usuário e o impede de bater às portas do Estado quando estiver viciado. 

6 de maio de 2011

Protejam a Justiça de Lula, Requião e os xiitas da boa causa; quando estão por perto, a democracia sai perdendo

Há muito que a justiça brasileira vem sendo posta em cheque. O primeiro a sustentar publicamente a tese de que o sistema judiciário trabalha para o atraso do Brasil foi o ex-presidente e agora palestrante Luis Inácio Lula da Silva. No dia 08 de abril de 2010, num encontro promovido pelo PC do B, o então presidente foi instado a falar sobre as eleições. Sobrou para a justiça eleitoral. Disse:

"Não podemos ficar subordinados, a cada eleição, ao juiz que diz o que a gente pode ou não fazer".

Lula acha que o executivo não pode ficar subordinado ao judiciário. Atendida sua necessidade e teríamos um poder subestimando o outro, quando a democracia repousa na independência e soberania de cada um.

Mas o que há na fala de Lula que possa indicar um descrédito na justiça; ou por outra: por que sua fala, individualmente, pode se estender à nação inteira?

Respondo:

A fala de Lula é reveladora de uma natureza. Suas palavras deixam transparecer uma categoria de pensamento bastante influente nos dias atuais: de que não há mal em consentir que um poder possa submeter-se a outro se, no final das contas, a intenção for boa.

É uma ideia perigosa. Da fala de Lula aos dias de hoje transcorreram-se pouco mais de um ano. Neste breve período, lembro-me de pelo menos outra ocasião na qual a justiça esteve num desmerecido descrédito.  

Foi à época da votação da famigerada Lei da Ficha Limpa. O STF decidiu o que era óbvio e fez valer o texto constitucional: a lei não poderia ser aplicada nas eleições de 2010 porque a Carta obriga que uma lei só tenha validade se aprovada um ano antes do pleito. Os ministros fizeram o que deles se esperava: protegeram a Constituição. O STF é uma corte constitucional e proteger a carta é sua única função.

Não foi o bastante. Imediatamente após a decisão, o ministro Luiz Fux, cujo voto desempatou a disputa e botou a Lei da Ficha Limpa no seu devido lugar, foi alvejado por críticas das mais absurdas. Internautas chegaram a criar uma página na internet para condenar aquele que consideravam “o culpado” pela decisão. Quem derrubou a lei da Ficha Limpa não foi Luiz Fux, foi a Constituição.

Não é que ninguém tenha alertado, mas é que os criadores da lei não admitiam que o texto fosse posto para discussão. Lembram-se da mobilização que o projeto criou? Qualquer um que quisesse discutir minimamente o texto da lei – mesmo que fosse para torná-lo constitucional – seria imediatamente desmoralizado, acusado de defender a imoralidade política.

Cumpre lembrar que o STF só julgou a lei quanto a questão do tempo necessário antes de sua aplicação. O tribunal ainda não julgou se ela é ou não constitucional – o que deve ocorrer assim que alguém se sentir prejudicado nas próximas eleições.

Quero esclarecer: sou a favor de uma política limpa, mas sem extremismos. Sou a favor de um congresso sem corrupção, mas dentro dos limites da Constituição – o que é possível de ser feito.

A constatação pode não agradar, mas é o que é: tanto Lula quanto aqueles que se voltaram contra o ministro Fux cumprem um desserviço à democracia, ainda que recorram a uma boa justificativa.  Pode não parecer, mas muita coisa ruim pode ser apresentada como um avanço democrático.

A propósito: os regimes totalitários do século XX, dos quais o Nazismo e o Fascismo são só os exemplos mais cabalmente conhecidos, chegaram ao poder relevando sua real natureza ou mostrando uma face mais amena, até democrática?

A solução

Num cenário tão árido para a justiça, num cenário no qual assistimos a um poder sendo destituído de maneira lenta, progressiva e repetidamente de suas prerrogativas, quem é que teria a solução?

Requião.

O senador, que há duas semanas, num exercício de tolerância democrática, arrancou a força o gravador de um repórter e apagou o conteúdo, resolveu, também ele, falar sobre a justiça. Como sempre, quando Requião julga alinhar-se com a democracia, a última sai perdendo.

Em um vídeo publicado recentemente em sua página, o senador resolveu explicar porque é o segundo no ranking dos parlamentares que mais acumulam ações no STF. Referindo-se aos ofendidos que ousaram abrir processo contra eles, disse:

"Enquanto a lentidão da Justiça não as julga, eles entram contra mim porque há um entendimento judicial, absurdo no Brasil, que eu só posso chamar um ladrão de ladrão depois que ele for julgado em instância final."

Entenderam?

Já que a justiça não funciona, Requião quer ele mesmo ser juiz da conduta alheia.

Joga a presunção da inocência, princípio que estabelece que qualquer pessoa é inocente até que se prove DEFINITIVAMENTE o contrário, no lixo para tomar ele próprio as prerrogativas de uma corte.

Requião é do PMDB, mas publicamente não critica a falta de ética do seu partido. Justo, não? 

4 de maio de 2011

Mais que confusão, comportamento do terror pós-morte de Osama acena para o enfraquecimento; o Ocidente deve aproveitar a oportunidade

O terror organizado fica mais ou menos fortalecido após o anúncio da morte de Osama Bin Laden? Menos. Pelo menos é o que se depreende do comportamento de um dos grupos terroristas islâmicos mais atuantes: O Talibã. Na manhã de terça-feira, (03), o grupo, que governou o Afeganistão até 2001 (embora reconhecido por apenas outras três nações como poder legítimo), decidiu soltar o primeiro comunicado oficial após o anúncio da morte de Osama. E o que dizia o Talibã? Reproduzo trecho da nota publicada pela Reuters. O texto é do repórter Hamid Shalizi.

O Taliban do Afeganistão disse nesta terça-feira não ter visto provas suficientes para convencer seus integrantes de que o líder da Al Qaeda, Osama bin Laden, esteja morto, no primeiro comentário do grupo desde que autoridades norte-americanas declararam que o mentor dos ataques de 11 de setembro de 2001 foi morto no Paquistão.

"Como os americanos não ofereceram qualquer prova aceitável para apoiar sua alegação, e como outros assessores próximos de Osama bin Laden não confirmaram ou negaram sua morte... então o Emirado Islâmico considera qualquer afirmação prematura", disse um comunicado do porta-voz do Taliban Zabihullah Mujahid enviado por email para a mídia.

Muito bem! Temos então que o Talibã (a grafia, assim, também é aceita) está, meio assim, duvidando da morte de Osama. Para acreditar, pedem provas concretas – o exame de DNA parece não ser o suficiente.
Agora vejam trecho de uma notícia retirada do site da revista Veja na mesma terça-feira (03) e sobre o mesmo Talibã.

Respostas ao assassinato de Osama bin Laden, o homem por trás do maior atentado terrorista em território americano, começam a chegar nesta terça-feira. Em entrevista à rede britânica BBC, os grupos extremistas Al Qaeda e Talibã juraram que atacarão forças dos Estados Unidos e Paquistão em retaliação.

Membros dos grupos disseram que o “martírio de bin Laden” abalou os insurgentes, mas não afetou a “guerra santa" no Afeganistão. Enaltecido como herói por grupos terroristas, bin Laden deve ser vingado, segundo um porta-voz do Talibã, em ataques contra forças de segurança paquistanesas, envolvidas na morte do terrorista, que já estão sendo planejados. Um dos parceiros da organização, o Haqqani – grupo que atua no Afeganistão e Paquistão – por sua vez, disse que seus membros redobrarão esforços na luta contra os EUA no Afeganistão.

Um pai

- Quando informado sobre a morte do terrorista, o talibã Mohammad Younus, há quatro anos ativo no Afeganistão, disse: “Bin Laden era como um pai para mim”. Younus prometeu que ele e seus companheiros realizarão ações contra forças americanas em território afegão, paquistanês e até americano.

A avaliação das duas mensagens atribuídas ao grupo demonstra, no mínimo, uma tentativa de manipular o Ocidente (mais especialmente os EUA). No máximo, deixa entrever que o terror pode não ser tão organizado como se supunha.

Na primeira nota, o Talibã exige provas concretas da morte de Obama. Fica evidente que eles embarcam na teoria de que, se não há fotos, não há morto. Raciocinemos: se o Talibã duvida da morte de Osama, porque falaria em retaliação, em vingança?

É evidente que no momento do primeiro anúncio, o Talibã quer é tirar proveito da opinião pública – que aquela altura questionava a existência de fotos – para ver incendiar os ânimos de seus membros. Mais um pouco e a gente começa a acreditar que a morte só passou a existir depois da fotografia.  

Obama fez bem em não autorizar a publicação das fotos. Não convém ao País agir de acordo com o que pedem os terroristas, não é? Não convém colocá-los como força legítima de negociação. Na prática o pedido do Talibã sepultou a intenção – se é que havia – de divulgação das fotos pelos EUA, pois o país estaria se submetendo à vontade dos terroristas.

Já a segunda nota mostra a real natureza do grupo – e dá fim ao movimento que surgiu em defesa de Osama, como se a separação de quase uma década entre o atentado que ele projetou e sua morte o fizesse menos culpado. Ou o Talibã mentia quando dizia não ter certeza da morte de Osama ou o grupo anda lá com as comunicações um tanto enfraquecidas. A segunda hipótese é, certamente, a melhor para o Ocidente. Mais que confusão, comportamento do terror pós-morte de Osama acena para o enfraquecimento e o Ocidente deve aproveitar a oportunidade. 

3 de maio de 2011

Osama e Obama: erros e acertos

Osama Bin Laden está morto. Seu corpo, segundo os EUA, jaz no fundo do oceano. Das reações que se seguiram ao anúncio, feito na madrugada de domingo para segunda-feira, uma chama especial atenção: aqueles que condenam o ataque americano em virtude das possíveis represálias empreendidas pela Al Qaeda, a rede terrorista da qual Bin Laden era líder.

A ideia é ruim. Convenhamos: a Al Qaeda não precisa de mortos para atacar. A natureza de sua ideologia é ser antiocidente (especialmente antiamericana) e, não houvesse morte de Osama, o risco de um atentado também existiria.

Ademais: que figura teria sido morta para que eles dessem cabo do 11 de setembro, nada mais nada menos que o maior ataque terrorista da História? Nenhuma!

Terroristas são terroristas porque não precisam de uma justificativa razoável para levar adiante seus planos homicidas.

Além disso, o argumento de que os EUA não deveriam atacar temendo represálias terroristas acaba fazendo o jogo dos próprios terroristas. Seria equivalente a argumentar que o Ocidente devesse requisitar a opinião dos extremistas sobre sua conduta. Seria deixar o Ocidente refém de um pequeno grupo de indivíduos doidivanas. Seria como perguntar à raposa como as galinhas devem portar-se.

“Ele pode nem ter sido morto, visto que não há corpo”. É uma alegação sem sentido. O presidente americano não se arriscaria a anunciar a morte de Osama e vê-lo daqui uns meses num vídeo divulgado pela Al Qaeda. Seria a completa desmoralização. Tendo em vista o cenário interno dos EUA, a última coisa que Obama desejaria seria a desmoralização.

Obama precisava de um Osama

Não há como negar o componente político da morte de Osama. A verdade é que Obama precisava de um Osama. Não há dúvida de que o maior cabo eleitoral de Obama será...Osama. Morto!

O presidente dos EUA, desde já em campanha para reeleição, deve usar amplamente o fato a seu favor. A quem diga, claro, que, caso venha a fazer isso, Obama está fazendo uso político descabido da captura. Estaria politizando a morte. Também é uma bobagem. A captura de Bin Laden tem dimensões políticas e, se foi realizada no governo Obama, ele pode, sim, tirar proveito do feito.

Mundo afora presidentes fazem uso político das vitórias de seus exércitos, por que só com os EUA isto seria condenável? O presidente é, em última instância, o comandante em chefe das forças armadas. As vitórias dela são também suas.

Matar Osama foi o principal acerto de Obama.

O erro de Obama

A morte de Bin Laden evidencia um problema para o presidente americano: a região do Oriente Médio, historicamente conflituosa, pode ficar ainda pior. O discurso de Obama, em que exalta a operação e termina com “a justiça foi feita”, tem potencial para incendiar o Oriente Médio. Ainda que os americanos tenham tomado a decisão acertada de não divulgar fotos nem sepultar o corpo em terra, a fala do presidente norte-americano não deixa de ser emblemática – e tem tudo para incitar ao ódio.

Some-se a isso o antiamericanismo latente na região e a instabilidade política – ou alguém ainda acredita no sonho dourado da “Revolução do Facebook”? – tem-se, certamente, um Oriente Médio menos receptivo ao Ocidente.

No Egito, por exemplo, a Irmandade Muçulmana já se organizou para participar das eleições, marcadas para setembro. A Síria reprime à bala seus opositores. Na Líbia, o ditador ainda no poder armou a população. Que governante faria isso não tivesse total confiança de que o povo estaria a seu lado?

Obama só na quer chamar de guerra o que, de fato, é guerra. Disse não quer e retifico-me: não pode. Para armar opositores – e tomar claramente uma posição no conflito – ele passou por cima do Congresso americano (que deveria aprovar a entrada do País numa guerra) e, de quebra, mandou às favas uma resolução da ONU que nem sequer fala em depor o ditador líbio.

O erro de Obama é confiar na falácia do Oriente Médio democrático. A cada dia, agora muito mais, o sonho fica mais distante. Com a morte de Osama, o Oriente Médio tende a ficar ainda mais árido para os norte-americanos. 

2 de maio de 2011

É preciso que voltemos a ser governados por políticos, não por mitos

O Brasil já tem uma mitologia política. Não somos mais governados por homens, por políticos. Somos governados por mitos. Um desavisado qualquer que se detivesse sobre a análise da atual crônica política brasileira não chegaria a conclusão diferente: somos uma República de mitos.

Desfilam em nosso panteão de deuses o primeiro presidente operário, a primeira presidente mulher e, chute dos chutes, podemos assistir ao nascimento da primeira presidente mulher negra (ou alguém dúvida que Marina Silva é, desde já, candidata em 2014?). Todos mitos.

Um mito não se constrói sem a complacência de boa parte da imprensa. Ela lhes dá um rótulo, uma identidade, uma embalagem com a qual se apresentam ao público. Ao fim, satisfeita com seu trabalho, rende-se ao mito, alimenta-o, engrandece-o e, raramente, mata-o.

Na última semana, assistimos à construção de um novo mito: o do senador vitimizado. Vitimizado e intempestivo. Trata-se de Roberto Requião. O peemedebista causou alvoroço na mídia após tomar, à força, o gravador usado por um jornalista e, não contente, apagar o seu conteúdo simplesmente porque se sentiu ofendido com a pergunta. O tema é sensível ao senador: a aposentadoria que ele recebe pelo tempo em que foi Governador do Paraná.

Como se não bastasse, no dia seguinte Requião foi à tribuna dizer que era vítima de bullying. Não, senador, o que o senhor faz é uma tentativa de acossar a imprensa. Faz-se o jogo sujo da manipulação. O senhor alega que a imprensa lhe é desfavorável na esperança de que ela se esforce para provar o contrário.

Alguém vai lembrar isso a Requião? É pouco provável. Estamos, todos, convencidos de que esse é o jeito do senador e não há nada a se fazer. José Sarney, nada mais nada menos que presidente do Senado, saiu em defesa do colega. Esqueceu-se da sua obrigação, à frente de uma instituição fundamental da democracia, para sair em socorro do amigo.

Mas qual é o efeito deletério do mito para a democracia? O problema é que para a existência do mito ser completa é necessário calar quem dele discorde. A existência de mitos corrói o debate democrático, empobrece-o, tira-lhe o essencial: a presença do divergente. Não há democracia que sobreviva ao aniquilamento do contrário. Não há sistema democrático que não sucumba ao soterramento da divergência. Não há democracia que possa sobreviver sob o governo de mitos.

O mito é inimputável. Seus crimes, seus deslizes, são meros rompantes de fúria, meros esguichos espontâneos de suas personalidades que devem ser perdoados, relevados em nome do bem que eles proporcionam. Assim, quem critica o primeiro presidente operário é preconceituoso, é elitista. Quem critica a primeira mulher presidente é machista. Quem critica a primeira presidente mulher negra é racista e machista (se for católico, é um pária).

Não precisamos ser governados por operários, mulheres, industriais, negros, ricos, pobres, homossexuais, heterossexuais, brancos ou amarelos. Precisamos de pessoas comprometidas com políticas públicas, e isto independe destas variáveis.

É preciso dar a César o que é de César. É preciso devolver os mitos à mitologia e os políticos à política.

É preciso que voltemos a ser governados por políticos, não por mitos.